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#36 | THE MIDNIGHT GOSPEL E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA MORTE


Animação The Midnight Gospel (Netflix, 2020)

⠀⠀Uma das poucas coisas das quais não conseguimos evitar é a morte, sendo essa a única certeza que temos. Contudo, vivemos como se a morte não existisse, ou melhor, apenas rolasse na família do vizinho de um primo distante. A morte é tão inalcançável que divide protagonismo nos telejornais, junto ao âncora galã que você jamais vai pegar, sequer fazer selfie; até que chega o fatídico dia em que alguém próximo morre e, em meio a lágrimas e luto, percebemos que ela é mais real e intragável do que nossa percepção pintava.


⠀⠀Sabendo da dificuldade estrutural em lidar com nossa finitude, a necessidade fez com que as religiões se tornassem ‘alicerces absolutos’ sobre o que é a morte e o que há depois da mesma, sendo que cada uma possui uma visão divergente da outra, desde o Budismo, ao Espiritismo até o Hinduísmo. Além das religiões, outra forma de interpretação do que pode ser a morte se dá por meio da arte. Uma dessas obras vem fazendo muito sucesso, especialmente entre os jovens, trata-se da animação The Midnight Gospel.

O QUE É THE MIDNIGHT GOSPEL?


⠀⠀The Midnight Gospel é uma animação desenvolvida por Pendleton Ward, mesmo criador do famoso Hora de Aventura, porém, a primeira sendo voltada ao público adulto. Com visual psicodélico e o desenrolar de um ‘podcast’ temático, narrado pelo comediante Duncan Trussell, cada episódio traz especialistas que discutem acerca da morte, legalização das drogas, filosofias orientais e até mesmo meditação.


Clansy entrando em seu simulador de universos (Netflix, 2020)

⠀⠀Durante as explicações do ‘podcast’, a animação desenvolve-se de forma – aparentemente – desconexa ao que se é dito. O protagonista da série, Clancy Gilroy, possui um ‘espaçocast’, onde entrevista os mais variados seres utilizando seu simulador de universos para tal. Todos os universos visitados estão em visível colapso, a exemplo do primeiro episódio, onde Clansy entrevista o presidente dos Estados Unidos sobre legalização das drogas em meio a um ataque zumbi.


⠀⠀Em todos os episódios da trama, há um fator que permeia sutilmente o enredo: a morte e transformação dos personagens por meio dela.

MORTE E SOCIEDADE


⠀⠀Apesar de a morte ser algo que permeia a vida de todos os seres vivos, sua interpretação sofre variações de acordo com o contexto religioso e social ao qual o indivíduo está inserido, ou seja, nem todos encaram a morte com sofrimento, há culturas que a veem por uma ótica positiva. Sociedades que lidam de forma leve com tal temática, tendem a assimilá-la apenas como uma passagem, uma ascensão do plano físico ao espiritual.


⠀⠀Para religiões como o Catolicismo, Protestantismo e o Islamismo a morte é interpretada como uma passagem que o indivíduo faz à vida eterna, dependendo de suas ações e a crença em Deus. Por outro lado, religiões como o Espiritismo e o Budismo enxergam a morte como um processo de evolução reencarnatório. Nem sempre a morte é interpretada como algo negativo, muito pelo contrário, alguns países africanos comemoram a morte de seus entes queridos. Inclusive, no México, existe uma data comemorativa chamada Festa dos Mortos, realizada no dia dois de novembro, onde a população vai aos cemitérios para relembrar seus entes e todos os seus hábitos e gostos, com muita música e comidas típicas.



MORTE E ARTE

Clansy entrevista a Morte (Netflix, 2020)

⠀⠀A animação apresenta a morte como um fator natural, que permeia sutilmente todos os mundos em que o protagonista decide visitar. Em um dos episódios mais marcantes, a morte conversa com Clansy do interior de uma caverna e o questiona: “como você quer que eu me materialize para você?” Ouvindo isso, ele a descreve de forma completamente aleatória e caricata, fazendo com que se materialize como uma figura alegórica. A partir desse momento, passa a ser a entrevistada do espaçocast, onde conta a história de como o embalçamento foi a base para transformar a morte em algo lucrativo, traçando um paralelo entre as mumificações e o mercado – lucrativo - funerário atual.


⠀⠀A série exclusiva da Netflix vem apresentar uma nova forma de lidar com a temática, utilizando como ferramentas seu visual futurista e dinâmico, atrelado aos ‘podcasts’ de excelente qualidade. Apesar da aparente desconexão entre áudio e vídeo, ambos vão se complementando de forma inteligente. A morte é apresentada de forma constante, seja por meio dos personagens, como também a partir dos sistemas e mundos que entram em colapso (capitalismo, Estado, estruturas sociais) por diversos ângulos. Tais considerações são capazes de ampliar nossa percepção acerca de como interpretamos a finitude das coisas, das pessoas ao nosso redor e de nós mesmos.

Cenas do último episódio de The Midnight Gospel (Fonte: Um Filme Me Disse)

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RECOMENDAÇÕES E FONTES:




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